Vamos ler um pouco acerca das diferenças entre "conto", "crônica" e "romance".
Exercício. Depois de ler o artigo, assista o vídeo "Os cem melhores contos brasileiros do século" (Nathália Mondo em Youtube), e logo poste um comentário no blog, antes da quarta-feira.
Conto
O conto caracteriza-se por ser uma narrativa
curta, um texto em prosa que dá o seu recado em reduzido número de páginas ou
linhas. Apresenta como sua maior qualidade os fatores concisão e brevidade.
Deve produzir em quem o lê, um efeito de impacto. Esse efeito tanto pode
resultar da natureza insólita do que foi contado, da feição
surpreendente do
episódio ou do modo como foi contado. Esta brevidade, porém, não pode
comprometer a qualidade do texto, que deve cumprir o seu papel junto ao leitor
com a mesma competência dos contos mais longos. O conto é do prisma de sua
história e de sua essência, a matriz da novela e do romance, mas isto não
significa que deva, necessariamente, transformar-se neles. Como a novela e o romance,
é irreversível: jamais deixa de ser conto a narrativa que como tal se engendra.
Trata-se, pois, de uma narrativa unívoca, univalente. Constitui uma unidade
dramática, uma célula dramática.
Portanto, contém um só conflito, um só drama,
uma só ação; unidade de ação. Todos os ingredientes do conto levam a um mesmo
objetivo, convergem para o mesmo ponto. Assim, a existência dum único conflito,
duma única “história” está intimamente relacionada com essa concentração de
efeitos e de pormenores; o conto aborrece as digressões, as divagações, os
excessos. Ao contrário, exige que todos os seus componentes estejam
galvanizados numa única direção e ao redor dum só drama. Quanto a esse objetivo
exclusivo para o qual deve tender a fabulação, podemos compreendê-lo
considerando o seguinte: a soma dos objetivos, parciais e absolutos, que vamos
tendo pela vida a fora, poderia dar uma série de pequenos dramas. A unidade de
ação condiciona as demais características do conto. Assim, a noção de espaço é
a primeira que cabe examinar. O lugar geográfico, por onde as personagens
circulam , é sempre de âmbito restrito. À noção de espaço segue-se
imediatamente a de tempo.
E aqui também se observa igual unidade. Com
efeito, os acontecimentos narrados no conto podem se dar em curto lapso de
tempo já que não interessam o passado e o futuro, as coisas se passam em horas,
ou dias. O conto caracteriza-se por ser objetivo, atual, vai diretamente ao
ponto, sem deter-se em pormenores secundários. Essa objetividade salta aos
olhos com as três unidades: de ação, lugar e tempo. Tratando-se das
personagens, poucas são as que intervém no conto, como decorrência natural das
características apontadas: as unidades de ação, tempo e espaço. Só não parece
possível o conto com uma única personagem: ainda que uma só apareça, outra
figura deve estar atuando direta ou indiretamente, ou vir a atuar na formulação
do conflito de que nasce a história.
A linguagem em que o conto é vazado também deve
ser objetiva, plástica e utilizar metáforas de curto espectro, de imediata
compreensão para o leitor; despede-se de abstração e de toda preocupação pelo
rendilhado ou pelos esoterismos. O conto quer-se narrado em linguagem direta,
concreta, objetiva. Dentre os componentes da linguagem do conto, o diálogo,
sendo o mais importante de todos, merece ser referido em primeiro lugar. O
conto por seu estofo eminentemente dramático deve ser, tanto quanto possível
dialogado. De acordo com as diferentes formas que se apresentam os contos, ou
seja, a proporção interna em que serão trabalhadas as unidades, podemos definir cinco tipos de contos: o conto
de ação, é um conto onde predomina basicamente a aventura, o que não significa
a ausência total dos demais componentes.
É um tipo de conto linear e menos importante do
que os outros, embora seja quantitativamente mais frequente; o conto de
personagem é menos comum e totalmente centrado no exame da personagem, mas
nunca deixando de obedecer a conjuntura própria do conto, visando sua unidade;
o conto de cenário é raro. A tônica dramática transfere-se para o espaço, o
ambiente. Este torna-se praticamente o herói do conto; o conto de ideia, embora
o escritor se utilize de personagens, conflito, etc., serve para mostrar uma
visão de mundo, ou seja, é um instrumento da ideia que pretende transmitir; o
conto de emoção tem o objetivo de transmitir uma emoção ao leitor e geralmente
vem mesclado ao da ideia.
Crônica
Crônica é uma narração. Uma história curta. É
um gênero literário produzido para livros, jornais, internet, entre outros
veículos de comunicação. Crônica tem como mote o cotidiano.
Possui algumas características. Pode ser
escrita tanto na primeira como na terceira pessoa. Ser sentimental ou
despojada, sempre coloquial. Ter sido inspirada em fatos reais ou fictícios.
Possuir uma linguagem irônica, séria ou humorística. Independente de desfecho.
É derivada do latim ‘chronica’ – antes mesmo da
era cristã significava ‘relato de acontecimentos em ordem cronológica’.
Simplificando: seria um breve registro de eventos.
Com o tempo, começou a ganhar força. Há dois
séculos, com o desenvolvimento da imprensa, a crônica começou a frequentar as
páginas dos jornais. Conta a história, teria ela aparecido pela primeira vez no
final do século XVI, em um jornal parisiense. Eram textos que comentavam fatos
reais, de acontecimentos ocorridos nos últimos dias na bela cidade europeia.
Chegou ao Brasil na segunda metade do século
XIX. Diferenciava-se pouco com os publicados na França. José de Alencar foi um
dos pioneiros a aderir a esse tipo de texto. Chegou a ser considerada uma
‘literatura menor’.
O tempo foi passando e outros foram seguindo o
caminho – um deles – tomado pelo autor de O Guarani (1870), Iracema (1875),
entre outros.
O tempo foi passando e a crônica passou a fazer
parte do dia-a-dia dos leitores no Brasil, diferenciando-se do estilo francês,
ganhando identidade própria.
Romance
A morte do romance tem sido anunciada ao longo
dos tempos. Desde o começo do século 20, por exemplo, quando George Lukács viu
a narrativa se distanciando da epopeia e, por isso mesmo, perdendo forças.
Depois reviu a posição. Nesse mesmo tempo, o texto de ficção passou por muitas
experiências, entre as mais notáveis no Ulisses, de Joyce, e no Em busca do
tempo perdido, de Proust, no movimento latino-americano, que revelou García
Márquez e Mario Vargas Llosa, até chegar ao medíocre romance norte-americano de
hoje, que envolve ainda os grandes vendedores.
Neste momento, portanto, a ficção se dilacera
entre a obra de arte e a obra voltada apenas para o leitor, transformada em
mercadoria. Aliás, os próprios autores norte-americanos tentaram reunir nas
suas narrativas as técnicas do romance policial e a história compra-e-vende dos
europeus, para combater, por exemplo, os árabes e indianos, que escrevem - e
são educados - em inglês. O mercado se diversifica, numa clara estratégia de
mercado, o que não é de todo ruim: afinal, alguém tem de vender para sustentar
as editoras.
Então nós temos aí duas realidades
incontestáveis: a arte e o mercado. Como, então, devem se comportar os escritores?
Em primeiro lugar não se preocupando com a questão das vendas, o que deve
interessar somente aos editores. Afinal, eles vivem disso. E os escritores não
vivem disso? É a segunda parte desta reflexão e que me interessa muito. As
vanguardas exauriram a narrativa, até pela própria natureza de movimento
literário. Mas só pode haver mudança através das vanguardas? Acredito,
sinceramente, que não. No entanto, devemos encontrar um caminho que também
possibilite a sobrevivência do romance. E ela se dá entre a simplicidade e a
sofisticação, tema do meu próprio livro sobre o assunto: As estratégias do
narrador, que deve ser publicado logo pela Iluminuras.
Na simplicidade, o romance deve chegar aos
olhos do leitor com tal leveza que não exija nenhum tipo de quebra-cabeça,
tornando-se cada vez mais leve. Aí está o segredo. No entanto, isto não quer
dizer que o escritor abdicará das técnicas interiores, que se revelarão na
sofisticação. Esse caminho, aliás, já estava sendo preparado por Machado de
Assis, sobretudo nos contos, e em Dom Casmurro, um dos romances mais bem
elaborados do final do século 19 e começo do 20 equiparando-se ao que de melhor
se escreveu na Europa. Não é sem razão que Harold Bloom escreveu: "Machado
de Assis é um milagre". E que Susan Sontag, surpreendida a cada palavra,
dizia que a escrita daquele mulato carioca era tão sofisticada que não podia
entender o fato de ele nunca ter se afastado do Rio de Janeiro mais do que
alguns quilômetros. Ai reside um tanto de preconceito. Mas,
tudo bem.
Simplicidade e sofisticação. É claro que
ninguém vai imitar Machado nem se quer revolucionar o romance - isso está fora
de cogitação. Mesmo assim, chamo a atenção para o fato de que ele pode ser lido
por todos, sem qualquer problema. Dois dos seus contos chamam a atenção
justamente por causa da simplicidade e da sofisticação: O Machete e Um homem
célebre. Embora Missa do Galo tenha se tornado o mais famoso, e reescrito até a
exaustão, esses dois reúnem elementos que podem apaixonar qualquer leitor comum
- pela simplicidade -, sem deixar de lado aquilo que de mais notável pode se
escrever, recorrendo a técnicas de montagem e de desenvolvimento de enredo.
Só para lembrar: O Machete começa pela técnica
do personagem ilustrativo, na figura do pai de Inácio Ramos - o personagem
central - para desaparecer imediatamente no segundo parágrafo, sabendo-se
apenas que ele morreu. Nada mais sutil. Naquele primeiro parágrafo que pode -
reitero - ser lido por qualquer um há uma carga técnica impressionante. O
personagem - o pai - ilustra o caráter de Inácio Ramos - o personagem - sem
cair no lugar-comum e possibilitando uma leitura agradável.
Pelos movimentos internos demonstra-se que a
relação pai e filho não é afetiva, embora não diga isso em lugar algum. É
possível perceber o afeto e o entusiasmo quando aparecem, logo em seguida, o
velho músico alemão e a mãe, esta sim, tratada com muito carinho, e colocada em
oposição ao pai. Sem que o narrador tenha que dizer. A leitura, por si só,
revelará os sentimentos.
Isso quer dizer: técnica. Não é regra - lembro
sempre: não existem regras para a ficção. Mas um caminho a que o escritor pode
ou não recorrer para o estudo. Nada mais do que isso. Sem encrencas nem
debates. Tenho o maior respeito pelos que divergem de mim. Só quero pensar.
Talvez discutir. Mas todos têm razão. E isso é o que importa: o amor pelo
romance. Enfim, pela escrita. Por isso mesmo, encontro aí motivos suficientes
para que se possa trabalhar o romance, cujos caminhos são cada vez mais ricos,
mesmo que se recorra, em certo sentido, ao passado.
Fonte:
pt.shvoong.com
www.ricardonascimento.net
rascunho.rpc.com.br